em Artigos

Como tomar uma decisão difícil

Passaremos a vida inteira tomando decisões. Não podemos fugir da tarefa de decidir. Até quando não decidimos, isso é uma decisão.

Como todas as decisões, tomadas e não tomadas, produz consequências, parece óbvia a importância de aprender a tomar decisões de forma independente e consciente, mas dificilmente você verá alguém preocupado com isso ou conversando sobre a melhor forma de decidir.

Eu acredito que os métodos que usamos para tomar decisões, se é que temos algum método, produzem diversos problemas. Pense por um segundo sobre a quantidade de tempo que você já perdeu demorando para tomar uma decisão ou tomando decisões equivocadas que produziram arrependimentos, perda de tempo e de oportunidades.

Vou compartilhar com você algumas reflexões que fiz recentemente sobre esse tema.

O poder da antiga tecnologia

As vezes a solução é tão simples que o mais difícil é acreditar nessa simplicidade.

Já faz muito tempo que inventaram a tecnologia mais poderosa que existe para nos ajudar nessa difícil tarefa de tomar boas decisões.

Sem essa tecnologia, a humanidade ainda estaria limitada a viver em tribos de no máximo 150 pessoas. Veja o trecho que tirei de um livro que reli recentemente:

“Entre os anos 3500 e 3000 a.C., alguns gênios sumérios desconhecidos inventaram um sistema para armazenar e processar informações fora do cérebro concebido especialmente para lidar com grandes quantidades de dados…  Com isso, os sumérios libertaram sua ordem social das limitações do cérebro humano, abrindo caminho para o surgimento de cidades, reinos e impérios. O sistema de processamento de dados inventado pelos sumérios é chamado de escrita“. 

Talvez você nunca tenha parado para pensar que a escrita é uma tecnologia. Uma tecnologia muito antiga que foi e é a base para a construção de todas as outras tecnologias criadas pelo homem. Sem ela, seria impossível para a humanidade construir tudo que nos cerca.

Nossos antepassados sumérios escreviam em tábuas de argila. Nossos pais escreviam sobre uma folha de papel utilizando uma caneta ou lápis. Você provavelmente aprendeu a usar um teclado de computador para escrever quando ainda era jovem. Seus filhos e netos estão aprendendo a escrever tocando os dedos em uma tela de vidro.

Aqui estão alguns exemplos de como os glifos dos sumérios mudaram ao longo do tempo.

 

A tecnologia de transferir ideias para um lugar fora do nosso cérebro foi algo revolucionário e ajudou a desenvolver civilizações antigas como sumérios, egípcios, chineses, astecas e maias. A escrita permitia esvaziar a mente, colocando do lado de fora todas as diversas informações difíceis de memorizar e que deveriam ser avaliadas para uma decisão.

Hoje, podemos guardar as informações úteis para uma decisão em papel ou em documentos e planilhas nos computadores. Se você tentar tomar decisões difíceis usando apenas a sua cabeça, você vai começar a fazer aquilo que estudiosos chamam de “looping”. Você vai perder uma enorme quantidade de tempo e energia, gerando ansiedade e estresse.

O nosso cérebro não foi projetado para lidar com a enorme quantidade de informações que temos hoje. As decisões no passado remoto eram mais simples. Atualmente existe uma enorme quantidade de variáveis que precisamos considerar antes de qualquer decisão, pois nunca o mundo nos ofereceu uma quantidade tão grande de opções.

Por mais de 200 mil anos, a vida das pessoas se resumia a correr em busca de alimento ou correr para não virar alimento nas florestas e savanas do mundo.

Nesse ambiente natural, você só tinha duas decisões básicas: fugir ou lutar. Você não precisava pensar muito para fazer isso. Até gatos, ratos e baratas sabem usar seus instintos para saber o momento certo de fugir ou lutar.

A vida urbana dentro de grandes cidades é uma realidade muito recente. Vivemos por centenas de milhares de anos sem meios eletrônicos de comunicação e de informação como telefone, rádio, TV e internet. Faz pouco tempo que os livros se tornaram baratos e acessíveis.

A liberdade para tomar decisões sobre diversos aspectos da vida é algo mais recente ainda. No passado, as pessoas nasciam com suas vidas mais ou menos definidas pelos seus pais, pela sociedade ou pelos lideres das tribos.

Ainda somos “cobaias” das grandes transformações que estão ocorrendo desde a chegada da escrita.

Recomendo que você assista o filme “A Chegada”. O trailer está logo abaixo. Ele parece um filme comum que fala sobre o contato com alienígenas, mas esse é o detalhe menos importante do filme.

O foco principal do filme é destacar o incrível poder que existe por trás da linguagem e da escrita como uma tecnologia capaz de revolucionar uma espécie.

Talvez, o próximo passo para o desenvolvimento humano dependa da invenção de uma linguagem falada e escrita, mais moderna, que possa ser universal, unindo todos os povos.


Decisões escritas

O texto mais antigo do mundo, escrito por sumérios em uma tábua de argila, não continha palavras de grande sabedoria para serem eternizadas. Não era uma expressão artística, não contava uma história ou poesia. Ele não tratava de temas religiosos ou filosóficos. As preocupações dos sumérios estavam mais concentradas na necessidade de tomar decisões para garantir sua sobrevivência.

O mundo dos sumérios estava ficando complexo, as cidades cresciam e estava muito difícil tomar decisões sobre as colheitas utilizando apenas as informações que podiam ser memorizadas.

Aqui está uma das primeiras coisas que a humanidade escreveu:

O texto acima diz:

“Um total de 29.086 medidas de cevada foram
recebidas no decorrer de 37 meses. Assinado, Kushim”

Um sumério chamado Kushim, 5000 anos atrás, resolveu registrar essas informações fora do próprio cérebro para tomar decisões sobre os seus estoques de cevada. O homem só teve tempo para fazer arte, escrever literatura e filosofar quando o almoço e a janta das crianças estavam garantidos através de outra recente tecnologia que era a agricultura. Ela exigia o desenvolvimento de conhecimentos administrativos como a escrita, matemática, planejamento, assim como os negócios exigem hoje.

O problema do loop

Você tem um problema para resolver dentro da sua cabeça e precisa tomar uma decisão. Você é tentado a encontrar uma solução rapidamente dentro da sua mente, sem perder tempo transferindo as ideias para um papel ou computador.

Em um determinado momento você acaba tomando uma decisão que acredita ser a melhor. Quase imediatamente depois, “vozes internas” começam a surgir questionando a sua decisão com questões do tipo: Será que essa é a melhor decisão? E se acontecer isso? E se acontecer aquilo? E se isso mudar no meio do caminho? E se aquilo não for o que estou pensando?

Você estará dentro do loop do “e se…” que levará para outro “e se” e muitos outros “e ses” infinitamente.

Sem anotar as respostas que você encontrará para cada “e se”, logo você se esquecerá e voltará a se questionar sobre o “e se” que já tinha decidido anteriormente. Alguns estudos mostram que nossa memória de curto prazo só consegue trabalhar com até 7 informações diferentes ao mesmo tempo (fonte).

Você provavelmente vai passar o dia inteiro pensando e repensando, como se estivesse “ruminando” as ideias sem chegar em nenhuma conclusão. É como andar em círculos.

Para piorar a situação, se você começar a pensar nas decisões importantes da sua vida antes de dormir, correrá o sério risco de ficar acordado a noite inteira girando em círculos entre um “e se” e outro. Durante o dia, você vai consumir todo o seu tempo e sua disposição com essas ideias circulares sem conseguir tomar uma decisão definitiva. Você acabará desistindo por exaustão.

Organizando antes de transferir

Para transferir suas ideias para o papel, você será obrigado a organizar essas ideias. Aqui temos uma grande vantagem da escrita. Na mente, as ideias se movimentam de forma caótica. Nossas emoções entram em choque com nossa razão.

Transferindo o problema e as diversas alternativas para o papel, você terá sua mente liberada desse peso para poder pensar as alternativas separadamente, uma depois da outra.

Quando a decisão for tomada, você ainda poderá listar tudo que precisa fazer, passo a passo, refletindo sobre cada passo.

Escrever permite reler, sempre que necessário, para relembrar sua decisão e tudo que você considerou para chegar naquela decisão.

Nesse processo vão surgir algumas dúvidas. Se elas forem registradas, você poderá dedicar algum tempo para pesquisar respostas para essas dúvidas. Anotando essas respostas você poderá refletir.

Como muitos dos meus leitores sabem, eu desenvolvo um trabalho de educação financeira através do site Clube dos Poupadores. É comum o educador financeiro recomendar a tarefa de anotar todas as despesas, receitas e investimentos, mas muitos repetem essas recomendações como se fossem papagaios, sem entenderem o real sentido dessas recomendações.

Se você não costuma fazer anotações, por não entender o real sentido desse trabalho, espero que esse artigo possa te inspirar a iniciar as suas anotações ainda hoje.

 

Escreva um comentário

Comentário

13 Comentários

  1. Excelente texto. Para tomar uma decisão é necessário medir os prós e os contras. Seu texto nos ensina que antes de tomarmos qualquer decisão precisamos entender estes prós e contras. E realmente, a melhor maneira de tomar uma decisão é registrando no papel os prós e os contras.

    • Oi Rodrigo. Escreva um texto, como se fosse uma carta para você mesmo. 1) Qual é o problema? O maior perigo na resposta dessa pergunta é você não ser capaz de identificar a origem do problema. Muitas vezes culpamos os sintomas, as consequências do problema, e não prestamos atenção na causa. Eliminar os sintomas não resolve o problema. Nem sempre a causa do problema é aparente. 2) O que você precisa fazer para resolver o problema? A maior dificuldade para responder essa pergunta é que muitas vezes queremos resolver um problema de curto prazo com uma solução que na verdade é um problema disfarçado que irá se revelar no futuro. Também temos uma tendência de tentar resolver o problema jogando a solução nas costas de outras pessoas, isso quando não acreditamos que a origem do problema está em outras pessoas. Quando você escreve, sobre as possíveis soluções, naturalmente você está sendo forçado a organizar das suas ideias. Na mente, tudo é desordem. No papel, ou na tela, é necessário o esforço para ordenar tudo.

  2. Parabéns pelo artigo Leandro!
    Felizmente muito nova eu desenvolvi o hábito de anotar quase todas as tarefas que tinha para realizar, os livros que queria ler, as coisas que queria comprar, os meus sentimentos, etc. Quando olho as anotações hoje de anos atrás, percebo que se não tivesse escrito diversas coisas não seria tão organizada, poupadora do próprio tempo e não teria realizado diversos sonhos. Lembro que sempre anotava minhas metas, como passar na UFRJ, e anotava os passos que precisaria dar e quais seriam a vantagens/dificuldades de cursar em outro estado. No final, consegui mesmo passar e, por ter relido tando como seria mais vantajoso em diversas esferas, não exitei em um só momento em não ir!
    Reconheço que isso não é maioria, mas, por experiência própria, reforço seu artigo: anotar tudo funciona!

  3. Olá Leandro Ávila,eu já assisti o filme A chegada e é muito bom e interessante a escrita.Eu agradeço pelos seus artigos e ensinamentos,que são excelente. A cada dia que passa aprendo mais,é como aquele ditado “Vivendo e aprendendo”. As vezes eu me questiono,porque eu não aprendi isso antes,então o tempo passa rápido e vejo que estou envelhecendo e preciso correr contra o tempo.Enfim continue assim ,um homem muito inteligente e ajudando as pessoas. muito obrigado! Nice

    • Oi Nice, muito obrigado. Sobre o questionamento “porque eu não aprendi isso antes”. Antes você não era a pessoa que é hoje. Chegou o momento certo para aprender mais sobre tudo isso. Parabéns.